- InformaçãoRio+20 oferece a oportunidade produzir novas propostas para conceber e organizar a transição até sociedades sustentáveis. Esta rubrica tentará agrupá-las sistematicamente a medida dos avanços do processo.
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16 Novembro 2011
Economia social e solidária: contributos às vésperas da cimeira Rio+20
Detalhes da proposta
ContextoTambém disponível em Français
A quinta edição dos “Encontros de Mont-Blanc”, que reuniu entre 9 e 12 de Novembro, em Chamonix, França, dirigentes da Economia Social e Solidária de vários países do mundo, pertencentes a instituições diversas, como mutualidades, bancos cooperativos, “bancos éticos e alternativos”, uniões de crédito, caixas de aforro, instituições de microcrédito, cooperativas, entre outras, centrou-se no tema da contribuição da Economia Social e Solidária para a superação da crise sistémica que vivemos. Uma crise económica e financeira, uma crise social e, também, alimentar e ambiental. O fosso que separa a economia real da economia financeira foi analisado e a questão de como reinventar a economia, através da experimentação social e da inovação, face às exigências ecológicas, de justiça económica e social, de democracia e de solidariedade, foi muito discutida.
Outra economia, democracia e solidariedade
De acordo com a presidente da Aliança Cooperativa Internacional, Pauline Green, o cooperativismo revela-se um modelo de viabilidade económica e de responsabilidade social, elevando a qualidade de vida das populações, criando emprego, engajando-se socialmente em várias causas democráticas, de justiça social, intergeracional e distributiva, de direitos humanos. Partindo do pressuposto de que “a eficácia económica não é suficiente para descrever a diversidade das motivações humanas”, a Economia Social e Solidária busca articular o projeto económico, através de uma ação empresarial que não recusa a eficácia económica, com o projeto social, ou seja, com o desenvolvimento social sustentável e a emancipação dos participantes. Trata-se, assim, de uma diferente, e alternativa, forma de empreender, através de organizações para quem a acumulação capitalista não é uma prioridade, mas antes a inclusão social através do trabalho.
Brice Lalande, ex-ministro francês do Ambiente, traçou algumas das mais relevantes articulações entre Economia Social e Ecologia, em direção a uma “Economia Verde” e ao conceito de “cidade sustentável”, projetos que exigem a passagem do pensamento económico único para uma “outra economia”, integrada por empresas de desenvolvimento sustentável e através da adopção de uma grande variedade de modelos económicos.
Uma informação e disseminação de experiências à escala global foi considerada indispensável, tanto mais quanto o conhecimento científico deve agora ser associado ao conhecimento local e comunitário, ampliando o conceito e as práticas do conhecimento como bem comum. Isso exige a criação de meios alternativos de comunicação e informação, em várias línguas e de acesso livre, conforme defendeu Charlotte Hess, dos EUA. Ademais, a diversificação e a maior autonomia das fontes de informação será um contributo ao conhecimento público e ao reconhecimento social de muitas formas de economia popular e com características informais que não se regem prioritariamente pelo lucro, que são ancoradas nas necessidades e nos recursos locais e que criativamente ensaiam novas e mais democráticas formas de governação participativa.
Revela-se, também, urgente elevar a Economia Social e Solidária, para o desenvolvimento sustentável, à categoria de novo ator mundial, designadamente junto às Nações Unidas. Como lembrou Cécile Molinier (diretora do PNUD), ao contrário dos pilares económico e social, o pilar ambiental é ainda o “parente pobre” junto da ONU. Em sentido semelhante, Jerôme Faure considerou que o próprio campo da Economia Social e Solidária é já vasto e muito plural, mas ainda insuficientemente definido, e Grethel Aguilar referiu a necessidade de o campo assumir compromissos mais claros no que se refere, por exemplo, à produção limpa e ao comércio justo. Foi ainda considerado indispensável que o desenvolvimento sustentável seja incorporado numa nova governança global, a qual será caracterizada por ser uma governança multi-atores e multiníveis. E, quanto à governança e gestão das organizações da Economia Social foi recordado por Gérard Andreck quão necessário é democratizar a governança das cooperativas e associações, cujos órgãos de governo e de gestão se encontram, por vezes, cristalizados e burocratizados. Ora as relações de poder no interior das organizações precisam ser mais discutidas, pois a democraticidade e a solidariedade que se pretendem emblemáticas na Economia Social e Solidária não são compatíveis com organizações pouco democráticas, altamente hierarquizadas e não participativas. O debate sobre modelos de organização e gestão das organizações, de tipo alternativo, parece carecer de maior reflexão no futuro, tal como a questão da formação das lideranças e dos quadros, dos participantes, dos associados e dos trabalhadores, não apenas em termos de desenvolvimento organizacional e de gestão de recursos humanos, ou sequer apenas com objetivos de formação profissional, mas também em termos de educação política e cívica.
Rumo ao Rio 2012
Num documento de resposta aos desafios colocados pela crise, apresentado como contribuição da Economia Social e Solidária para a cimeira do Rio, em 2012, parte-se do princípio de que não se pode permitir a privatização dos recursos que são considerados de interesse comum, tais como os da saúde, da educação ou da cultura, do mesmo modo que os recursos da terra, da água, das florestas, da energia, etc. Esse seria um perigo acrescido em termos de crise social e ecológica a nível planetário, ameaçando a democracia, o acesso ao bem-estar e também a atmosfera, a biodiversidade, os oceanos, a floresta.
Assim, entende-se que o social, e o combate à erosão dos compromissos sociais por parte do Estado e do mercado, representa a dimensão que deve comandar, no presente e no futuro, remetendo o económico para a dimensão de um importante instrumento, mas não de um fim em si mesmo. Só assim será possível estabelecer algumas formas de controlo sobre as derivas especulativas e de maximização dos lucros, que resultam de lógicas de ação técnico-racional e de decisões consideradas óptimas, mas desligadas da promoção de valores humanistas, democráticos e de justiça que, como se sabe, não constituem valores centrais das lógicas de privatização, de mercado e de “livre escolha” induzidas pela “Nova Gestão Pública”. Ao contrário, uma espécie de “New Deal” social, ecológico e democrático, a nível planetário, é apresentado como uma opção relevante para o combate à dívida dos países pobres, para a promoção do comércio justo, para a proteção da biodiversidade, para a democratização da economia em direção a uma “Economia Verde”, no contexto da renovação das funções do Estado social e da valorização política de novos atores e movimentos sociais.
Documento de orientação: para mudar a mundialização
Os “Encontros de Mont-Blanc”, na sua quinta edição, aprovaram um documento sobre desenvolvimento sustentável, a ser apresentado aos chefes de Estado que participarão na cimeira Rio+20, a partir do enfoque da Economia Social e Solidária e dos seus contributos à mutação do processo de mundialização, intitulado “Declaração de Chamonix” (https://www.rencontres-montblanc.coop).
Cinco eixos principais foram definidos, enquanto pistas para a saída da crise: democratizar a economia e regular a finança; promover um modo de governação partilhado; oferecer novas alternativas sociais; alimentar melhor o planeta e reimplantar o ambiente; reorientar a mundialização para a humanizar.
O reforço legislativo e o reconhecimento político dos estatutos das cooperativas, organizações mutualistas e associativas, e das empresas não capitalistas, é considerado incontornável em termos de qualidade de emprego, de utilidade social, de governação democrática, de participação cidadã. Os Estados são solicitados a desenvolver uma “ecofiscalidade” e a eficácia energética, a promover as energias renováveis, a apoiar a agricultura biológica e a defender os direitos dos povos à sua “soberania alimentar”. Esses e outros elementos são considerados necessários, tendo em vista reorientar a mundialização para a humanizar.
Algumas relações com a aprendizagem e educação de adultos
Formalmente presente num painel, juntamente com as questões da juventude e da cultura, a educação e aprendizagem ao longo da vida aparece subjacente a vários documentos e a diversas intervenções, mas é, ainda, um campo pouco desenvolvido e raramente nomeado. Ao contrário do discurso articulado sobre economia e políticas sociais, bem como das incursões relevantes no domínio do desenvolvimento sustentável, a aprendizagem e educação de adultos podem, em tal contexto de relativo apagamento, correr alguns riscos. Desde logo o risco de serem tratadas como apenas dimensões, ou variáveis, do processo de democratização da economia e da sociedade, sem presença substantiva, ou limitadas a lógicas estreitas de gestão de recursos humanos, de tipo meramente adaptativo e funcional. Porém, algumas experiências, trazidas sobretudo de África e da América Latina, apontaram para óbvias e importantes conexões a desenvolver entre o campo da Economia Social e Solidária e a educação popular de adultos, a educação comunitária e para o desenvolvimento local. É contudo interessante perguntar até que ponto um sector económico-social crítico e alternativo é capaz de vir a estabelecer pontes com concepções igualmente críticas, democráticas e transformadores em termos de educação e de aprendizagem. Foi visível, durante o Encontro, algum interesse e uma certa curiosidade pelas matérias educacionais, bem como algumas experiências no terreno, mas este parece ser um novo tema que exigirá trabalho e discussão no futuro e, quem sabe, na sequência do que foi proposto por um ou outro participante, poderá vir a merecer um próximo encontro dedicado ao assunto.
Seja como for, sempre que os participantes insistem no processo de humanização da mundialização e na construção de alternativas e possibilidades, é para nós impossível deixar de pensar no carácter educativo das formas de mobilização política e social no contexto de organizações e outros colectivos, bem como na multiplicidade das aprendizagens sociais que, necessariamente, resulta da ação transformadora conduzida pelos atores sociais. Como recordou, na sessão de encerramento, Michel Rocard, ex-primeiro ministro da França, a tradição mutualista e cooperativista remete para uma carta de valores democráticos e solidários; um referencial que, seja em termos históricos, seja na atualidade, mantém relações com a educação social, com a pedagogia dialógica e emancipatória, com a aprendizagem coletiva e cooperativa, facto que pode vir a suscitar sinergias e formas de cooperação entre o campo da Economia Social e Solidária e o campo da Aprendizagem e Educação de Adultos.
Licínio C. Lima. Participante em representação do ICAE
Actores Atores da economia e da organização da sociedade
Regiões
Europa
Temas
Economia social