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Injustiça geracional Injustiça geracional

 

Quase 200 anos depois da revolução industrial, o modelo de sociedade capitalista chega ao seu limite. A atual crise planetária envolve o modo de ser e estar no mundo, em todos os seus hábitos e dimensões. É uma crise que ameaça a vida no nosso planeta, algo como nunca se viu, e que pode ser caracterizada como uma crise geracional. Esse é o ponto de partida para a ação política na realidade contemporânea. O capitalismo não dá conta de garantir o Estado de Bem-estar Social para toda a população global. O próprio conceito de Estado não contempla todos os tipos de sociedades existentes e, portanto, não dialoga com diversos sentidos importantes para a qualidade de vida e o bem viver. As pessoas não se sentem mais representadas por governantes e parlamentares. Na economia, estão em xeque o uso de combustíveis fósseis e a produção em larga escala. A desigualdade, as mudanças climáticas, o esgotamento da natureza, a mercantilização da vida, a injustiça ambiental são características estruturais desse modelo.

 

Dinâmicas tão arraigadas culturalmente não serão mudadas de forma abrupta. A busca deve ser por alternativas capazes de integrar nossos modos de vida e as dinâmicas da natureza. A humanidade está obrigada a reinterpretar-se, a revisitar as suas lógicas, para garantir a viabilidade do planeta. Essa reorganização deve assegurar condições de vida justas para todas as pessoas.

 

Pacto entre gerações

 

Todas as vezes que a sociedade se viu em crise, as juventudes emergiram como segmento importante para os processos de transformação social. Jovens são capazes de respostas que extrapolam as lógicas correntes, de enfrentar os desafios mais duros e difundir informações na base da sociedade. Não são só as desigualdades do presente que estão em jogo, mas também a qualidade de vida da humanidade no futuro. As decisões tomadas agora repercutirão mais para as populações hoje jovens do que para os que neste momento deliberam. É a juventude atual que sofrerá as consequências nas próximas décadas da exploração indevida da natureza. É por isso que o tema socioambiental é inerentemente uma questão das juventudes. Temos assistido à supressão do direito à vida geração após geração. Cada uma deixa o mundo pior para a seguinte. A crise planetária é uma profunda injustiça geracional, que tem como pano de fundo a luta de classes, e demanda um pacto entre gerações.

 

Os movimentos juvenis de perspectiva transversal, sistêmica e socioambiental contribuem assim com olhares e práticas específicos cruciais para a superação da crise. Esses movimentos se fortalecem porque vão além de aspectos técnicos da sociedade global, como o desempenho de tecnologias e a eficiência energética das indústrias, e convidam a todos para mudanças de caráter enfaticamente cultural, para afirmar outra percepção de vida. Os movimentos de juventude são ainda mais importantes porque as transformações profundas que o mundo precisa passam por conflitos internos da geração contemporânea de jovens. O instante atual é chave. A juventude vive numa sociedade em que valores ditados por interesses prioritariamente econômicos têm predominância. Jovens estão sendo desafiados neste momento a fazer as suas opções, a estabelecer-se culturalmente numa sociedade em que os direitos individuais e coletivos são subjugados pelas liberdades privadas de megacorporações.

 

Rio+20

 

Nesse sentido, as juventudes precisam ter papel de destaque no processo da Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, a Rio+20, e da Cúpula dos Povos na Rio+20. É importante integrar nesse processo as ideias e olhares de coletivos de juventudes das várias partes do mundo. As juventudes são o segmento mais vulnerável às políticas sociais e ambientais insustentáveis, e isso deve ser levado em conta na construção de espaços de debate e tomada de decisões. A Cúpula dos Povos é o lugar para construir e fortalecer a integração dos movimentos juvenis. O campo das juventudes é diverso, mas há o entendimento de que o capitalismo é a causa das várias crises que a humanidade enfrenta. O envolvimento da juventude com o meio ambiente tem amadurecido no decorrer das últimas décadas, e as conferências das Nações Unidas ilustram isso. Na Carta de Estocolmo, documento da Conferência Internacional sobre Meio Ambiente Humano, realizada na capital sueca, em 1972, a juventude foi citada somente como parte do “esforço para a educação em questões ambientais, dirigida tanto às gerações jovens como aos adultos”. Isto é, não se considerava a efetiva participação da população jovem nas decisões estratégicas. A carta expressava ainda uma visão totalmente antropocêntrica sobre o meio ambiente, capaz de afirmar que, “de todas as coisas do mundo, os seres humanos são a mais valiosa”.

 

Vinte anos depois, a Agenda 21, documento elaborado durante a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, a Eco-92, no Rio de Janeiro, dedica todo um capítulo à juventude. Com concepção mais avançada, o Tratado de Educação Ambiental para Sociedades Sustentáveis e Responsabilidade Global, produzido no Fórum Global, da sociedade civil, defende o envolvimento ativo da juventude no tema. Ao chegarmos à Rio+20, que marca o aniversário da Eco-92, ao mesmo tempo que a conferência está organizada de uma forma que impede iniciativas transformadoras e metas ousadas, pesquisadores, movimentos e organizações sociais têm cada vez mais trabalhado em prol da justiça socioambiental. Esse não é um movimento involuntário. Pelo contrário, é resultado do processo de mobilização das últimas décadas. Como Eduardo Galeano, muitos jovens acreditam que “a gestação de um novo mundo será neste mundo que está”. Muitos cultivam uma esperança crítica e utópica de que é possível alcançar um mundo igualitário e diverso, superar as propostas de repaginação do capitalismo (leia-se economia verde) e afirmar os reais interesses e necessidades dos povos. É essa busca que deve tomar nossos corações e mentes.

 

 

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